LADRÕES DE CARTOLA NUM PAÍS COM AS ESTRUTURAS A CEDER



Este texto foi inspirado num artigo que li AQUI.

Deixei Coimbra, minha Terra Natal, quando Salazar estava, ainda, no poder. Era muito nova, mas apercebia-me de que o “ar era pesado”. Isso não passava despercebido à minha sensibilidade. Em cada canto ouvía-se sussurrar contra o regime. Vivia-se mal. A fome andava escondida, porque se alguém fosse apanhado a pedir, na rua, corria o risco de ser preso. Hoje temos como que um vidro transparente e podemos ver o que vai acontecendo, até certo ponto, com maior facilidade. Sim, até certo ponto porque há muitas pessoas ainda que não revelam o que se passa no seu seio familiar, porque têm vergonha. Sabemos que, para uma parte da nossa sociedade, a favor e praticante das aparências, quem passa fome é como quem sofre de doença rara, contagiosa. Quantas pessoas preferem o silêncio, ou eventualmente a morte, a dar a conhecer o que está a passar-se nos seus lares. Homem honrado não deve ter dívidas, mas ladrão disfarçado de qualquer coisa, do que quer que seja, pode ter o que ele quiser, desde que continue a roubar. Há como que uma certa protecção oferecida a quem souber roubar bem. Não obstante saibamos que os alertas vão surgindo e as “irregularidades” se vão descobrindo – embora num processo muito lento e insuficiente – o que é um facto é que o ladrão de cartola continua a operar em vários sectores. Não importa, porém. Haverá sempre uma lei, um parágrafo, um disfarce, uma camuflagem de acções, etc., de tal ordem possível, que mesmo que descobertos e presos, o bom ladrão acaba por ser libertado. É necessário que acabe por sair da prisão, para que ocupe um outro lugar importante, algures, não importa onde, como recompensa de ter sido preso, coitadinho, até porque ele não pode vir a tornar-se em mais um a sofrer da praga que só é permitida aos roubados: passar fome. Isso não pode acontecer.



Maria Letra
Imagem de João Drummond 

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